Chegaram há 2700 anos. Ainda hoje, em 2025, vivem 8.000 a 15.000 Judeus no Irão. Esta é uma das histórias fascinantes, que te leva para lá dos roteiros turísticos convencionais, e que podes conhecer no Irão: a da sua antiga, resiliente e prevalente comunidade judaica. Nos Portugueses em Viagem exploramos destinos improváveis e gostamos de mergulhar em narrativas que revelam a complexidade cultural dos lugares. Hoje vamos conduzir-te ao coração de uma das mais antigas comunidades judaicas do mundo, que floresce há mais de dois milénios nas terras da antiga Pérsia. Uma história de fé, identidade, sobrevivência e adaptação no meio de convulsões históricas e políticas. Uma história que merece ser contada e ouvida com atenção e respeito. Sabe mais no Blog dos Portugueses em Viagem. A presença dos judeus no território que hoje chamamos Irão remonta a cerca de 2700 anos. Tudo começou com o exílio da Babilónia, quando o rei Nabucodonosor destruiu Jerusalém e deportou milhares de judeus. Muitos destes acabaram nas cidades persas do crescente fértil, onde encontraram não só refúgio mas, em muitos casos, prosperidade. A viragem histórica deu-se com a ascensão de Ciro, o Grande, fundador do Império Aqueménida, que conquistou a Babilónia em 539 a.C. e decretou o regresso dos judeus a Jerusalém, permitindo-lhes reconstruir o Templo. Esse ato é celebrado até hoje, tanto na história judaica como persa, e está inscrito no famoso Cilindro de Ciro, considerado por alguns como a primeira carta dos direitos humanos. Muitos judeus, no entanto, decidiram permanecer nas terras do Império Persa, dando início a uma presença contínua que se estende até à actualidade. Durante os séculos seguintes, sob diferentes dinastias persas, os judeus foram geralmente tolerados, ainda que sujeitos a períodos de discriminação, pogroms e pressões para conversões ao Islão, sobretudo nos períodos safávida e qajar (sécs. XVI–XIX). É importante notar que o Irão (antiga Pérsia) nunca expulsou os judeus em massa, ao contrário do que aconteceu em Portugal, onde a expulsão dos judeus foi oficialmente decretada em 1496 por ordem do rei D. Manuel I. Esta diferença é significativa e revela uma abordagem historicamente distinta da presença judaica por parte dos dois países. A viragem moderna aconteceu com a ascensão da dinastia Pahlavi, em 1925. Reza Shah e, depois, o seu filho Mohammad Reza Shah, lançaram um vasto programa de modernização e laicização do país. Com estas reformas, os judeus obtiveram cidadania plena, puderam abrir escolas próprias, publicar jornais, criar associações culturais e exercer profissões liberais com liberdade. Em meados do século XX, a comunidade judaica iraniana era vibrante, activa e bem integrada, particularmente em centros urbanos como Teerão, Isfahan e Shiraz. Em 1978, estimava-se que existissem cerca de 80 mil judeus no Irão, envolvidos em todos os sectores da sociedade, da medicina à ciência, da educação à administração pública. Contudo, o grande abalo viria com a Revolução Islâmica de 1979. A chegada ao poder do aiatola Ruhollah Khomeini e a transformação do Irão numa república teocrática islâmica alteraram radicalmente o ambiente social e político para todas as minorias religiosas. Embora a nova Constituição iraniana reconhecesse oficialmente o judaísmo como uma das religiões protegidas, garantindo um assento reservado no parlamento (Majles) e liberdade religiosa, a ligação histórica, cultural e religiosa dos judeus ao Estado de Israel tornou-se um fardo pesado num país onde Israel passou a ser considerado o inimigo número um, levando à emigração massiva para Israel, Estados Unidos e Europa. Ainda assim, milhares permaneceram. Hoje, estima-se que existam entre 8 000 e 15 000 judeus no Irão, sendo a maior comunidade judaica do Médio Oriente fora de Israel. Este grupo reduzido, mas resiliente, mantém viva a tradição com discrição, mas também com dignidade. Em Teerão, funcionam ainda 20 sinagogas, várias escolas judaicas, uma casa de repouso para idosos e o notável Hospital Sapir, fundado por judeus e aberto a pacientes de todas as religiões. Existe ainda um jornal comunitário, Ofogh-e Bina, escrito em persa com temas ligados ao judaísmo e à cultura iraniana. Os judeus continuam a participar na vida pública, incluindo no serviço militar, e elegem regularmente o seu representante parlamentar, um símbolo de inclusão num sistema político profundamente conservador. A vida quotidiana dos judeus iranianos está cheia de desafios. Por um lado, a comunidade goza de liberdade religiosa: as sinagogas funcionam, o Shabat é respeitado, as festividades como o Pessach e o Yom Kippur são celebradas. Por outro, vivem sob vigilância constante e precisam de garantir que a sua identidade religiosa não se confunde, em momento algum, com qualquer tipo de lealdade a Israel. Importa notar que existe um esforço claro para distinguir “judeus” de “sionistas” no discurso oficial, e muitos líderes da comunidade fazem questão de se posicionar como patriotas iranianos. O bairro judeu de Oudlajan, no centro histórico de Teerão, é uma das zonas mais emblemáticas para quem deseja explorar esta herança viva. Ali encontramos a sinagoga Ezra Yaghoub, construída em 1895 e ainda em funcionamento, assim como vestígios de casas tradicionais judaicas, banhos públicos, escolas e lojas. É um bairro antigo, impregnado de história, onde os vestígios arquitectónicos contam uma narrativa de coexistência. Uma visita a Oudlajan é um passo atrás no tempo, um mergulho num Irão multicultural que muitos desconhecem. O caso do Irão desafia as simplificações. É um país onde a negação de Israel faz parte da ideologia oficial, mas onde a comunidade judaica continua a existir. É um país onde a religião oficial é o Islão Xiita, mas onde igrejas arménias, templos zoroastras e sinagogas judaicas mantêm as portas abertas. Esta tensão entre repressão e tolerância molda o quotidiano das minorias. Para os judeus iranianos, a fidelidade à sua fé é inseparável da lealdade à sua pátria, uma equação delicada que exige resiliência, pragmatismo e coragem. Para os viajantes curiosos, atentos às camadas invisíveis de um país, o Irão oferece uma experiência única. Não é apenas a beleza de Isfahan, os bazares de Tabriz ou as mesquitas de Yazd que impressionam, é também a diversidade das suas minorias, a profundidade das suas histórias, a forma como a cultura herdeira de um grande império sobrevive. Conhecer a história dos judeus do Irão é compreender melhor o que significa pertença, resistência e identidade num dos contextos mais complexos do mundo contemporâneo. É descobrir a diferença entre fé e nacionalidade. Os judeus do Irão representam uma das mais antigas diásporas judaicas do planeta, preservando tradições ancestrais em plena República Islâmica. São simultaneamente guardiões do passado e actores do presente, adaptando-se aos desafios políticos com engenho e determinação. A sua identidade é profundamente, e simultâneamente, persa e judaica. Se te interessas por culturas resilientes, histórias por contar e destinos que desafiam preconceitos, não deixes de acompanhar as nossas Expedições e o Blog dos Portugueses em Viagem. O mundo é bem mais vasto do que parece. Até onde és capaz de ir? expedições incríveis |
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